Editorial
Resumo
Prezados(as) leitores(as)
Com entusiasmo oferecemos o novo número de nossa Revista, mantendo a expectativa de que o seu conteúdo venha a estimular e frutificar reflexões sobre o ENVELHECER.
A partir da constatação do aumento significativo da porcentagem de idosos na população mundial e da crescente mudança de seu papel, circunstâncias estas relacionadas à construção social do presente contexto histórico e econômico, buscamos interrogar como a psicanálise, teórica e clinicamente, pode contribuir para o estudo de tal parcela da população. Em termos gerais, observa-se que as inexoráveis mudanças corporais, quando o tempo mostra sua face mais explícita, trazem um estranho a ser recebido, simbolizado e integrado na linha da vida, mas que, de outra forma, poderá ser desmentido ou até mesmo tornar-se uma sombra sobre o Eu. Assim, interrogamos como seria possível conceber metapsicologicamente o envelhecimento, quais ilusões e desilusões nos acompanham e o que conquistamos com a experiência de envelhecer, analisando como isto se apresenta na clínica psicanalítica com idosos. Ampliamos a indagação para refletir acerca de como envelhecemos na condição de analistas e como envelhecem igualmente os preceitos e as instituições psicanalíticas.
Iniciamos com a publicação de trabalhos que abordam as vicissitudes do envelhecimento. Abrão Slavutzky, em Aprendendo a envelhecer, inspirado em uma carta de Freud, então com setenta e nove anos, endereçada à Lou Andreas-Salomé, discorre sobre a presença da bondade, expressa na gratidão, e do humor, como elementos auxiliares para o enfrentamento dos inevitáveis horrores advindos da decadência corporal e mental causada pelo envelhecimento, acrescentando ainda a paciência – elemento tipicamente analítico – como balizadora do processo. Silvia Flechner, em Envelhecer é humano, estuda os fatores presentes no corpo, na psique, na sociedade e na cultura contemporânea que se entrelaçam no processo de envelhecimento, dando uma qualidade específica ao seu desenvolvimento. A seguir, Vivian Peres Day apresenta um paralelo entre o mito de Sísifo presente em Camus e uma visão psicanalítica do envelhecimento saudável no artigo O paradoxo da finitude. Prosseguindo com essa seção, Maria Lucia Castilho Romera, no artigo Envelhec(S)endo: temporalidade interpretante?!?, advoga sobre o direito de ser velho nos termos de cada individualidade, rompendo com a categorização de como o outro vê aquele que envelhece, permitindo que o contato com a experiência particular seja o elemento autorizador do ser nesta etapa da vida.
Um vértice metapsicológico sobre o envelhecimento está presente nos dois artigos seguintes. Em busca do infantil na velhice, de Cláudio Laks Eizirik, aborda a busca do elemento mais genuíno de cada um como condição para, de forma verdadeira e profunda, nos envolvermos na experiência de estar vivo ao longo de todo o ciclo vital, tanto no indivíduo que envelhece quanto na escuta analítica, à medida que o analista também envelhece. Juan David Almeyda Sarmiento e Herivelto Pereira de Souza, em “‘Tenho dois relógios, sempre tive dois, um no pulso e outro na cabeça.’ Notas sobre o Unheimlich e a velhice a partir de O pai (2020), estudam a experiência da velhice nos termos do tempo, do corpo e da família, contida nos limites presentes nas noções de o Inquietante e de o familiar de Freud.
Um terceiro conjunto de artigos está direcionado ao estudo clínico do envelhecimento. Abrindo a seção, em Envelhecendo. Tudo é Rio, Miriam Altman, Esther Abramo Gonçalves, Greice Priscilla Kökény de Oliveira e Francisca Izabel Pereira da Silva Teixeira trazem dados quantitativos de pacientes com mais de 55 anos atendidos ao longo de oito anos no CAP da SBPSP, os quais ajudam a qualificar o universo da chamada clínica psicanalítica do idoso, mostrando, por meio de exemplos clínicos, a contribuição que a psicanálise pode trazer para pessoas que atravessam este período da existência. O artigo seguinte, Onde me encontro? Não me reconheço! de Tereza Guimarães, busca estudar as ansiedades dos idosos, decorrentes das mudanças físicas e psíquicas e de suas manifestações clínicas. Por sua vez, Francisca Izabel Pereira da Silva Teixeira, em Atando as pontas do fio da vida: o acompanhamento clínico de Alice, apresenta-nos o sensível relato clínico de uma paciente que inicia o seu atendimento psicanalítico em uma fase inicial de Alzheimer, demonstrando as vivências internas da dupla ao longo do processo, assim como orientando sobre algumas adaptações técnicas neste campo de trabalho. Cibele M. M. Di Battista Brandão, no trabalho Transformações e expansões do envelhecer, ao longo de situações clínicas, orienta sua abordagem para as vivências do paciente e do analista frente ao envelhecer e seu trabalho de significação. Seguindo neste caminho, publicamos a tradução do texto de Peter Fonagy, When analysts need to retire: the taboo of ageing in psychoanalysis, para quem agradecemos a gentileza da autorização. O autor disserta com sensibilidade e profundidade sobre o difícil período que antecede a decisão da aposentadoria por parte de um psicanalista, assim como suas particularidades psicodinâmicas e éticas, tanto individuais quanto institucionais, alertando para este tema desconcertante, por vezes objeto de negação, mas inevitável de ser enfrentado.
Completando o rol de artigos temáticos, publicamos Passagem do tempo, ilusões e desilusões em um grupo societário: Fato clínico psicanalítico, de Germano Vollmer Filho, em que a coexistência de diferentes gerações, com suas ilusões e desilusões, são impactadas pela dor da diferença, pois, ao se tentar sobrepujar tal coexistência por meio de sua abolição, corre-se o risco de perder a autenticidade proveniente da aceitação da realidade externa e da aceitação de si próprio.
Por fim, na sessão de Temas Diversos, encontra-se o artigo Clínica de casal. Somos diferentes? O estrangeiro no casal, de Lisette Weissmann, que, a partir da Psicanálise das Configurações Vinculares, estuda a dificuldade de aceitação das diferenças subjetivas no seio do casal, inserido e influenciado pelo contexto social.
Desejamos a todos e a todas uma proveitosa leitura!
Renato Moraes Lucas
Editor Chefe da Revista de Psicanálise da SPPA
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